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Alto da Montanha

  • jhiroshi
  • 7 de mai. de 2021
  • 3 min de leitura

Atualizado: 23 de nov. de 2023


Outro dia acompanhei junto com uma equipe multidisciplinar composto por 03 psicólogos e 01 assistente social na qual também fazia parte, estávamos realizando uma reunião de famílias com alta vulnerabilidade social no Parque do Jaraguá. Após encerramento desse encontro, tivemos a oportunidade de visitar também o Pico do Jaraguá, porém só alguns tiveram o real interesse e a iniciativa de subir aproximadamente os 242 degraus e contemplar a vista da cidade de São Paulo.


Durante a escalada, observei que a minha condição física não me ajudava e por vezes tive que parar para recuperar o fôlego. Durante essas paradas, você tem que controlar a respiração ofegante, aceitar a contragosto uma súbita contração muscular nas pernas pela falta de uso e no descanso temporário até que você se sinta preparado para reiniciar a escalada até uma próxima parada entre os degraus.


Durante o percurso, senti o cheiro da “macela de travesseiro” (erva tipicamente brasileira), notei o vento gelado tocando em meu rosto, observei aves carniceiras voando ao longe e percebi que estava só naquela escalada, tal como já havia feito certa vez no Cerro el Condor (Bariloche). Não de não haver outras pessoas em minha volta, mas na condição de que aquela experiência era individual, portanto única.


Toda experiência me trouxe as lembranças quando escalava uma montanha íngreme coberta de neve na qual era acompanhado por três alpinistas e pelo meu irmão que se encontrava á frente por ter desde aquela época estar mais em forma física do que eu. Aquele momento não se pode ser registrado pelo olhar de uma câmera fotográfica na ocasião, o ambiente era meio inóspito, nossa atenção era focada em andar ziguezagueando para não haver maiores desgastes físicos, tampouco o uso das raquetas de neve que usávamos como calçado nos colocava num andar ritmado e que carecia de muita atenção de nossa parte.


A experiência daquela jornada era única, tal como me sentia aos subir aquelas escadas no Pico do Jaraguá. Durante o percurso, um dos guias sentiu-se mal e retornou ao acampamento, mas não eu, estava convicto que estar lá deixará de ser apenas uma atividade radical e passou a ser um teste para mim de determinação e superação. Logo meu irmão chegou ao topo e me aguardava para sentar ao meu lado no sopé daquele pico desfrutando de um gole de chá quente numa garrafa térmica. Sentamos finalmente juntos por um curto período de tempo e vislumbramos uma cadeia de outras montanhas na qual compunha a Cordilheira dos Andes. Eu senti também tamanha comoção ao notar que aquele breve momento com meu irmão se dissipariam, mas que também aquele momento seria único, portanto verdadeiro.


Nossa relação como irmãos sempre foi diferente, no contexto de idades e grupos de amigos, com o tempo ele casou, teve filhos e se mudou. Porém eu sinto de coração que o que tivemos lá no alto daquela montanha foi verdadeiro como ele também descreveu em seu artigo publicado em jornal local. Aquela experiência me acompanha quando tenho que escalar por outros desafios que não me exigem o esforço físico, além de que ainda sinto que teremos outras oportunidades de regressar aquela montanha.


A reflexão que deixo aqui, é que não precisamos estar subindo o Pico do Jaraguá, nem no alto de uma montanha, muito menos saltar de paraquedas, mas que cada vez menos a experiência de protagonista se torna secundário hoje em dia. Há uma necessidade de compartilhar todo estímulo oferecido, nos tornando coadjuvantes dessa experiência, todas as sensações devem ser registradas não tanto pelo olhar humano, mas pelo olhar digital e cinematográfico. Não cito a poesia e a beleza registrada no clique de uma máquina fotográfica por um profissional, mas na experiência do “aqui e agora”, de estar naquele exato momento, ou de estar só ou com pessoas queridas, incríveis ao seu lado e isto lhe render uma experiência única, uma lembrança que não precise ser compartilhada virtualmente...


Qual foi a ultima vez que vivemos uma situação incrível sem estarmos online?
Dificilmente vivemos uma experiência sem estar com um celular para documentar o momento

Autor: José Hiroshi Taniguti

 
 
 

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